PROPRIEDANDES FISICAS DA PELE



       As propriedades físicas da pele variam entre diferentes indivíduos, regiões do corpo, e em diferentes idades. Dependem principalmente das redes fibrosas de colágeno e elastina, as quais constituem a matriz dérmica, com sua arquitetura entrelaçada e envolvida pela substância intersticial.
       A epiderme, barreira que varia de 0,07mm a 0,12mm de espessura, contribui pouco para as propriedades mecânicas. A derme, de espessura entre 1 mm e 4 mm, contém 15% de colágeno tipo III, em sua maioria na derme papilar, ou seja, nos cerca de 10% mais superficiais da derme, onde se observam as fibrilas e fibras mais finas. A fração restante refere-se ao colágeno tipo I, encontrado predominantemente na camada reticular, na qual se observam fibrilas e fibras mais espessas.
       O colágeno é o principal componente da derme. Na estrutura de tripla hélice do procolágeno, excretado pelos fibroblastos, destacam-se os aminoácidos glicina, hidroxiprolina e hidroxilisina. Várias moléculas são agregadas progressivamente em tropocolágeno, filamentos de colágeno, fibrilas e fibras, as quais encontram-se espiraladas no estado de relaxamento. A tração da pele provoca o estiramento destas fibras na direção da força de tração, até um ponto limite em que as mesmas se alinham paralelamente umas às outras, em estrutura muito resistente à extensão adicional.
       As fibras elásticas da derme são bem mais finas que as colágenas, e diferentemente destas, apresentam junções látero-terminais. Sua função é retornar a rede de colágeno deformada por forças de tração à condição de relaxamento. As fibras elásticas, também sintetizadas pelos fibroblastos, são compostas de elastina e proteínas microfibrilares, sendo em parte responsáveis pela tensão natural da pele. O estiramento excessivo crônico ou o excesso de exposição aos raios ultravioleta podem causar fragmentação das fibras elásticas, resultando em perda da capacidade de retorno ao estado original de repouso, tornando a pele mais viscosa.
       A substância fundamental amorfa ocupa os espaços entre as fibras elásticas e colágenas, funcionando como lubrificante para esta microarquitetura móvel. É formada pelo fluido intersticial e complexos de glicosaminoglicanas e proteínas, denominados proteoglicanas e glicoproteínas.
       Glicosaminoglicanas, antes denominadas mucopolissacarídeos, são carbohidratos lineares de peso molecular elevado, formados pela polimerização de uma unidade constituída por um ácido urônico e uma hexosamina, geralmente glicosamina ou galactosamina. São poliânions extremamente hidrófilos, sendo que a água de solvatação forma ao redor destas macromoléculas várias camadas ordenadas e fixas. Quanto mais polimerizadas as glicosaminoglicanas, maior a viscosidade da substância amorfa. A glicosaminoglicana mais comum é o ácido hialurônico ou hialuronan. As demais são na maioria sulfatadas, e encontram-se ligadas covalentemente às proteínas da matriz. Incluem o sulfato de condroitina, sulfato de dermatana, queratossulfato e sulfato de heparitina.
       As proteoglicanas influenciam a morfologia das fibrilas de colágeno, sua organização e estabilização em fibras e feixes de fibras, e previnem a calcificação de tecidos conectivos. A principal proteoglicana dérmica é a decorina, de estrutura simples, uma única cadeia de sulfato de dermatana ligada a uma cadeia polipeptídea. É encontrada na superfície do colágeno; pode ligar-se e neutralizar o fator transformador de crescimento beta (TGF-b), citoquina fibrogênica associada a diversos fenômenos fibroproliferativos, inclusive cicatrizes hipertróficas pós-queimaduras. Outras proteoglicanas de importância produzidas por fibroblastos incluem a biglicana, molécula de estrutura semelhante à decorina, porém contendo duas glicosaminoglicanas, e uma grande proteoglicana conhecida como versicana, que contém entre 12 e 15 cadeias de sulfatos de condroitina e dermatana. O TGF-b estimula a expressão de biglicana e versicana, enquanto ao mesmo tempo reduz a expressão de decorina.
       A fisiopatologia de variadas situações clínicas pode ser influenciada por alterações do metabolismo das proteoglicanas. Como exemplo, a síntese de ácido hialurônico e outras glicosaminoglicanas encontra-se diminuída no envelhecimento, explicando o menor turgor da pele do idoso.
       Entremeadas às redes de colágeno e elastina estão outras três, os vasos sangüíneos, linfáticos e as fibras nervosas. Estas não contribuem para as propriedades físicas da pele, porém podem sofrer interferência quando as redes fibrosas são deformadas. Assim, sob tração excessiva continuada, a constrição dos vasos sanguíneos pode levar à necrose; a constrição dos nervos causar dor e a interrupção dos linfáticos provocar edema. As redes fibrosas são transfixadas ainda por folículos pilosos, os quais provavelmente restringem a mobilidade da derme.
       As propriedades físicas da pele foram caracterizadas inicialmente por DUPUYTREN (1834). LANGER (1861), analisando as variações direcionais na tensão e extensibilidade cutânea no organismo, descreveu suas famosas linhas de clivagem, também chamadas de máxima tensão, ou de extensibilidade mínima.
       Com fins descritivos as propriedades físicas da pele são divididas em propriedades visco-elásticas, tensão cutânea, e extensibilidade.
Materiais elásticos recuperam sua dimensão ou forma inicial após uma deformação sem nenhum gasto energético. Por outro lado, materiais puramente viscosos cedem continuamente sob a ação de uma força, e não retornam ao estado original espontaneamente após a retirada desta última, requerendo para isto uma força adicional. A pele apresenta uma combinação destas duas propriedades, sendo visco-elástica. Após uma deformação, retorna ao estado original pelo componente elástico; entretanto, nesta recuperação segue uma curva diferente, menos linear, devido ao consumo de parte da energia aplicada na pele. A energia é parcialmente dissipada no escorregamento viscoso das fibrilas de colágeno durante o alinhamento com a direção da força.
       O comportamento “stress-strain” (alongamento versus força de tração) da pele é composto de três fases. Sob forças de tensão menores a rede fibrosa oferece pouca resistência à deformação, sendo o comportamento determinado predominantemente pelas fibras elásticas. Esta porção inicial, rápida e quase linear da curva aparentemente envolve o alongamento das regiões flexíveis e espiraladas das moléculas de colágeno. A deformação puramente elástica inicial é seguida pela fase de deformação visco-elástica e finalmente uma fase puramente viscosa. Sob forças de tensão intermediárias, as fibrilas de colágeno passam a oferecer resistência à deformação, predominando então o elemento viscoso. Na zona de falha, ou seja, sob influência de forças elevadas, ocorre a desfibrilação do colágeno.
       Sob a ação de uma força constante, mantida através do tempo, a pele continua a estirar, conforme as fibras progressivamente se alinham, concomitantemente ao deslocamento da substância intercelular. Esta extensibilidade intrínseca e inerente caracteriza o estiramento mecânico, sendo a magnitude proporcional à quantidade de fluido intersticial presente na derme. O estiramento mecânico não deve ser confundido com o estiramento biológico, que compreende a geração de novo tecido secundariamente a forças de estiramento crônicas, como observado em técnicas de expansão tecidual, na gestação, ou na obesidade.
       Por mecanismo semelhante, quando a pele é estirada a uma determinada distância, mantida constante, a força requerida para manter esta distância decresce gradualmente. Esta propriedade explica a possível melhora, após algumas horas, de um retalho inicialmente suturado sob grande tensão.
       A tensão e a extensibilidade naturalmente existentes na pele são freqüentemente confundidas e chamadas de “elasticidade”. Estas propriedades se inter-relacionam, a pele se estende se maior tensão é aplicada e, da mesma maneira, a pele estirada está sob maior tensão. Porém, são conceitos distintos e normalmente discutidos separadamente.
       A tensão cutânea varia nos diferentes sítios anatômicos e em diferentes direções, sendo importante na cicatrização. Determina o posicionamento preferencial de incisões de maneira que a tensão através das mesmas seja mínima, sob pena de evolução com cicatriz hipertrófica. A tensão cutânea diminui com a idade, explicando por que os idosos evoluem com cicatrizes de boa qualidade. Por outro lado, em algumas áreas, como ombros e pré-esternal, a tensão existente é grande em todas as direções, e cicatrizes alargadas ou hipertróficas são muito comuns. A tensão naturalmente existente na pele é presumivelmente uma função do estado de tensão da rede de fibras elásticas, pois as fibras colágenas não têm capacidade de retração. A gravidade contribui para o aumento da tensão cutânea em algumas áreas.
       As tensões às quais a pele é submetida podem ser de origem estática ou dinâmica. Tensões estáticas são as naturalmente existentes na pele, dependentes das características estruturais dérmicas. As tensões dinâmicas são causadas pela combinação de forças relacionadas a ações musculares voluntárias, como o movimento das articulações e a mímica facial, e com a gravidade. Alteram a magnitude e a direção das tensões cutâneas locais. Os músculos da mímica facial, por exemplo, se inserem diretamente nas camadas profundas da pele. A pele se adapta ao encurtamento provocado pela contração muscular por meio da formação de rugas e sulcos perpendiculares ao eixo longo das fibras do músculo. As linhas de Langer descrevem as tensões cutâneas estáticas predominantes em determinado local, sem nenhuma referência às influências dinâmicas do sistema músculo-esquelético.
       Rupturas dérmicas ou estrias podem resultar quando a tensão é aplicada em velocidade maior que a capacidade de expansão cutânea. Ocorre freqüentemente no abdome durante a gestação, na doença de Cushing, ou no estirão do crescimento. Como regra geral, as estrias posicionam-se perpendiculares às linhas de Langer, que representam a direção de mínima extensibilidade. Não foi determinado se as fibras realmente se rompem ou simplesmente perdem o arranjo quaternário.
       A pele sã é extensível a fim de não limitar qualquer movimento possível ao sistema músculo-esquelético. Na maioria das regiões, a pele se estende mais em determinadas direções que outras, assim como a tensão. Com o passar dos anos a habilidade da matriz de tecido elástico em retornar a pele do estado estendido ao completamente relaxado é gradualmente perdida, e a extensibilidade cutânea é substituída por flacidez, que cumpre a mesma função de permitir a liberdade de movimentos.
       O fotoenvelhecimento refere-se aos efeitos específicos da exposição crônica ou aguda à irradiação ultravioleta, superimpostos aos efeitos do envelhecimento intrínseco ou cronológico. Enquanto o envelhecimento cronológico puro apresenta atrofia dermo-epidérmica, com diminuição das fibras elásticas e colágenas, glicosaminoglicanas, vascularização, número de fibroblastos e capacidade de biossíntese, o fotoenvelhecimento evolui com atipia de células basais, lesão endotelial, degradação de colágeno e acúmulo de grande quantidade de elastina anômala (elastose), contribuindo para a perda de elasticidade. Horas após exposições sub-eritematosas ao UVB já são detectadas na pele humana metaloproteases de degradação da matriz ativas.

Comentários